Susto no cemitério não assombrado

Para dar início aos causos que irão povoar as telas desse blog, selecionei uma história verídica, ocorrida na década de 70 do século passado.

Antes de mais nada é preciso dizer que já fomos católicos apostólicos romanos devotos - inclusive fomos coroinha. Isso para explicar porque nessa ocasião estávamos numa antiga casa de retiro, localizada na zona rural da Grande Porto Alegre.

Nessa época era comum reunir grupos de jovens durante um final de semana para meditar e receber orientação espiritual num local afastado.

Essa casa em particular pertencia a uma ordem religiosa e ficava numa enorme propriedade, cercada por um jardim e relativamente isolada, oferecendo o silêncio e recolhimento que a ocasião ensejava. É preciso dizer que nessa época ela abrigava também um retiro para os membros idosos da fraternidade, que ali viviam em paz seus últimos momentos antes de se juntar ao Criador.

Eu já conhecia o lugar e até tinha meus recantos favoritos, mas dessa vez um dos monitores - sabe-se lá motivado por qual razão - inventou de nos levar num passeio inusitado.

Era noite de sábado para domingo, por volta da meia-noite, e um grupo de curiosos se formou no pátio interno, aguardando o início da aventura. Saímos pela porta da frente do casarão, que aquela hora mais parecia um castelo perdido no descampado, realçado por uma lua cheia que  iluminava tudo como um farol de prata, dando contornos fantasmagóricos aos arbustos que ladeavam o caminho. O monitor ia na frente liderando o grupo e eu, curioso, logo atrás. Em breve percebi que nos dirigíamos a uma alameda que levava ao Cemitério da Ordem!

Ao chegar no portão de ferro que dava passagem ao campo santo, o monitor fez uma pausa para agrupar o pessoal. Enquanto isso aproveitei para olhar ao redor e percebi uma coisa interessante. Os muros que circundavam o cemitério haviam sido derrubados - ignoro o motivo - tendo sido deixado um trecho de cada lado do portão de modo a sustentá-lo.

Não recordo se alguém protestou ou se recusou a entrar. Sei dizer apenas que éramos em torno de vinte pessoas passeando entre as tumbas, na maior tranquilidade. Até que ...

Passado algum tempo o monitor nos chamou e disse que era hora de retornar aos quartos e descansar. Aos poucos o pessoal foi se reunindo do lado de fora, enquanto ele aguardava a saída de todos para fechar o portão.

Lembro que já havíamos caminhado uns dez metros quando de repente alguém começou a gritar desesperadamente. Era voz de mulher. E vinha do cemitério!

Parte do grupo arrepiou o cabelo e tratou de sair dali o mais rápido possível. Felizmente o monitor teve mais presença de espírito e, junto com ele, fomos ver o quê estava acontecendo.

Uma pobre alma (uma das moças participantes do retiro) havia ficado para trás e não ouvira a chamada para sair. Quando se deu conta que estava sozinha, a meia-noite, num cemitério, em plena lua cheia, entrou em pânico e correu para o portão. Que estava fechado.

Desesperada ela se agarrou nas grades e começou a chorar e gritar, esquecendo que bastava um empurrão para abri-lo - não estava trancado - ou dar a volta, pois os muros haviam sido removidos.

Não sei se o acontecido teve alguma consequência mais grave para o monitor - duvido que essa incursão noturna tenha sido aprovada pelos organizadores do retiro. Quanto a moça, depois de alguns litros de água com açúcar, seguiu em frente e nunca mais tocou no assunto.


Comentários

  1. Curioso. Me lembrei de um passeio que fiz aqui no Recife antes da pandemia.
    Foi com o projeto Recife Assombrado, atividade gratuita da prefeitura.
    Visitamos os túmulos do Cemitério de Santo Amaro com um guia.
    Só que foi de dia e não houve corre-corre. Hehehe

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    1. Garanto que o momento mais emocionante do nosso passeio foi essa última parte! É por causa dela que lembro daquela ocasião passados já seus 45 anos ou mais ;)

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